sexta-feira, 29 de março de 2024
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Ucrânia

Aparentemente ao ouvirmos falar dos acontecimentos recentes vindos Ucrânia poderemos afirmar que tudo está distante de nós – geograficamente e muito mais, historicamente. Mas não. A história da Ucrânia é parte da história brasileira.

De acordo com o presidente da Representação Central Ucraniano–Brasileira, Dr. Vitório Sorotiuk os descendentes de ucranianos no Brasil constituem hoje uma comunidade de mais de 500 mil pessoas e estão localizados em sua maioria no Paraná. Em Curitiba, são aproximadamente 55 mil pessoas, porém, o maior percentual ocorre no município de Prudentópolis, onde cerca de 75% da população é descendente de ucranianos.

As razões da imigração eram sociais, políticas e econômicas. Tais imigrantes sabiam da importância da educação para seus filhos e, impulsionados pela liberdade que o Brasil oferecia, relevaram os percalços e lutaram, fazendo do Brasil sua nova terra, transformando dificuldades em oportunidades.

Monumento Holomodor no Parque Tingui em Curitiba-PR.
Monumento Holomodor no
Parque Tingui em Curitiba-PR.

Quem visita Curitiba encontra no parque Tingui o Memorial Ucraniano e ali instalado o monumento alusivo ao Holomodor. Obra do artista paranaense Elvo Benito Damo.

A grande fome é conhecida na Ucrânia como “Holodomor”. Foi a grande fome artificial provocada a mando de Stalin. Um dos mais representativos capítulos da idiotice humana. Planejado e posto em prática pelo regime comunista soviético durante os anos de 1932 e 1933, a expropriação de terras e gado para a coletivização do povo, aliada a constantes repressões políticas, gerou uma catástrofe. Estima-se que a fome provocada artificialmente tenha dizimado cerca de 1/3 da população ucraniana, entre 3 a 10 milhões de pessoas.

Nos anos de 1930 os intelectuais franceses de esquerda alimentavam todo o tipo de ilusões e esperanças em torno da União Soviética, daí a azeda colhida que tiveram de André Gide e seu livro Regresso a U.R.S.S., por mostrar uma visão desalentada, para não dizer muito crítica, daquela experiência (as autoridades soviéticas tentaram impedir a publicação e asfixiar a questão em silêncio).

Eles tiveram que esperar mais de vinte anos para tomar conhecimento da realidade atroz do stalinismo, e outros vinte para perder as ilusões do maoísmo e compreender que Mao, ídolo substitutivo para os jovens do maio de 68 francês, foi um tirano tão atroz quanto foi Stalin.

Existem outros testemunhos lamentáveis de semelhante equívoco. Em 1954 quando voltou da União Soviética, Jean-Paul Sartre não viu inconveniente em declarar para o Jornal Liberation: “a liberdade de crítica é plena e total na União Soviética”.

Nem ele nem muitos outros intelectuais deram crédito ao livro de Victor Kavchenko Eu escolhi a liberdade, que revelou o que mais tarde seria confirmado por Soljenstsin em Arquipélago Gulag ( a mais forte e influente obra sobre como funcionavam os campos de concentração e trabalho forçado na antiga União Soviética de Josef Stalin).

Ucrânia – a crise atual

Ao analisarmos o que acontece no nosso mundo ou entre outros mundos distantes como é o caso da Ucrânia precisamos observar o paralelo histórico entre a atualidade e o seu passado recente.

O Colapso da União Soviética em 1991 permitiu a convocação de um referendo que resultou na proclamação da independência da Ucrânia.

Em 2004 Viktor Yushchenko foi o vencedor das eleições presidenciais e que foi derrotado nas eleições legislativas de 2006. Viktor Yushchenk viu sua aliança política se desintegrar pouco após assumir o poder e, com a popularidade em queda sob acusações de corrupção e sinalizando um retorno à política pró-rússia, aceitou seu antigo adversário Viktor Yanukovych como primeiro ministro.

Envenenamento de Viktor Yushchenko
Envenenamento de Yushchenko

Durante sua campanha para a presidência, num episódio que ficou bem conhecido, Yushchenko foi envenenado por uma substância chamada dioxina incapacitando-o de participar da campanha presidencial, deixando seu rosto inchado e manchado. Yushchenko inspirou cidadãos do mundo inteiro ao lutar para que o resultado das urnas ucranianas refletisse a vontade da população. Mas em 2010, Yushchenko perdeu a eleição para Viktor Yanukovych.

Em 2013 cidadãos ucranianos exigiram uma maior integração do país com a União Européia, que Viktor Yanukovych rejeitou, afirmando ser desvantajoso para a Ucrânia.

Em novembro de 2013 eclodem manifestações contra a recusa do governo ucraniano em assinar um acordo com a União Européia. Com o tempo, o movimento, denominado Euromaidan (Euro= Europa + Maidan = praça da independência) promoveu uma onda de grandes manifestações e agitação civil por todo o país, incluindo clamores pela renúncia do presidente Yanukovich e de seu governo. Os protestos foram desencadeados também pelo autoritarismo opressivo do governo, a corrupção generalizada das autoridades, a cleptocracia e a falta de oportunidades.

A violência intensificou-se depois de 16 de janeiro de 2014, quando o governo aceitou as leis antiprotestos. Os manifestantes antigoverno então ocuparam edifícios do centro de Kiev, incluindo o prédio do Ministério da Justiça, e tumultos deixaram 98 mortos e milhares de feridos entre os dias 18 e 20 fevereiro.

A estátua do líder soviético Lênin é derrubada por uma multidão: o símbolo da forte recusa dos manifestantes pró União Européia
A estátua do líder soviético Lênin é derrubada por uma multidão: o símbolo da forte recusa dos manifestantes pró União Européia

Em 22 de fevereiro de 2014, o Parlamento da Ucrânia destituiu Yanukovych por considerar o presidente incapaz de cumprir seus deveres e definiu uma eleição para 25 de maio para selecionar o seu substituto.

A REVIRAVOLTA

No entanto, na manhã de 22 de fevereiro de 2014, opositores tomaram conta do país e ocuparam as principais instituições estabelecidas em Kiev. O presidente Viktor Yanukovych havia viajado para um congresso de deputados e governadores da Ucrânia Ocidental e Criméia. A oposição acusou Yanukovich de ter fugido de Kiev e querer abandonar seu cargo como presidente, e através de um impeachment depôs oficialmente o presidente por “negligência de suas funções”, com o voto favorável de 328 dos 450 deputados, mais de dois terços que a Constituição exige para destituição, no entanto, não foi criada uma comissão de inquérito, passo requerido pela Constituição para investigar as razões pela qual se pretendia destituí-lo, o que faz deste ponto de vista constitucional, a “destituição” do presidente seja mais do que questionável. Na cidade de Kharkiv, Yanukovych denunciou um golpe de estado.

Após a remoção de Yanukovych do poder pela segunda vez em nove anos (a primeira vez como primeiro-ministro), o Congresso dos Deputados e governadores regionais do leste e do sul da Ucrânia apelaram à resistência e acusaram a oposição de não cumprir o acordo de paz firmado em 21 de fevereiro com o presidente deposto.

Enquanto isso, o Paralemnto (Verkhovna Rada) aboliu a lei sobre as línguas minoritárias, que estabelecia que onde um determinado idioma fosse falado por pelo menos 10% da população, essa língua pode adquirir o estatuto de língua oficial; a revogação da lei aprovada em 2012 prejudica os falantes de russo (co-oficial em toda a Ucrânia oriental e meridiona. Em 25 defevereiro o Verkhovna Rada decidiu entrar com uma ação contra Yanukovych por crimes contra a humanidade perante o Tribunal Penal Internacional em Haia.

O governo russo reiterou que não reconhece o novo governo em Kiev uma vez que considera Viktor Yanukovich “o único poder legítimo na Ucrânia” e argumenta que “todas as decisões tomadas pelo Rada nos últimos dias levantam sérias dúvidas”, pois na Ucrânia “o presidente legítimo foi derrubado por um golpe de Estado”.

A CRIMÉIA EM APUROS

Com o colapso da União Soviética em 1991 a Criméia tornou-se parte da recém independente Ucrânia, uma situação ressentida por parte da população de maioria russa e causadora de tensões entre a Rússia e a Ucrânia. Com a Frota do Mar negro baseada na península, houve apreensões de conflito armado.

A Criméia proclamou sua independência em 5 de maio de 1992, mas concordou mais tarde permanecer parte integrante da Ucrânia como uma República autônoma. Apesar de fazer parte da Ucrânia, a maioria dos cidadãos da Crimeia são de origem russa.

Em Sebastopol, a cidade mais importante da Criméia, a Rússia tem a base da sua frota do Mar Negro. Segundo o último acordo assinado com o governo ucraniano, a Rússia manteria esse porto até, pelo menos, 2042. “Rússia jamais, jamais abandonará Sebastopol” dizia há dois anos Igor Kasatonov, comandante da Frota Russa do Mar Negro. (Por razões geoestratégicas, a Rússia não está disposta a perder a base de Sebastopol).

Contrariamente, as minorias ucraniana e tártara apoiam o novo governo de Kiev e exigem continuar integrados na Ucrânia.

Acontece que hoje a Rússia pretende manter a ocupação, afirmando que o ato é na manutenção da Independência.

Angela Merkel apelou para o presidente Putin mais uma vez que respeite a integridade territorial da Ucrânia
Angela Merkel apelou para o presidente Putin mais uma
vez que respeite a integridade territorial da Ucrânia

MIGRAÇÃO FORÇADA

Pelo menos 143 mil pessoas deixaram a Ucrânia com destino à Rússia, na seqüência dos recentes acontecimentos que abalaram a antiga república soviética, disseram autoridades russas.

A chanceler Alemã Angela Merkel apelou para o presidente Putin mais uma vez que respeite a integridade territorial da Ucrânia. A chanceler lembrou Putin, de acordo com seu porta-voz, do memorando de 1994, no qual a Rússia respeita a independência e soberania da Ucrânia e suas fronteiras existentes.

Putin, com a potencial intervenção militar russa na Ucrânia, defendeu e explicou que os eventos na Criméia e na Ucrânia são um perigo para a vida dos cidadãos russos e da população de língua russa em seu telefonema.
O parlamento russo aprovou o envio de tropas na península de Criméia ucraniana, no sábado(01/03), a pedido de Putin.

O autor é historiador

Sérgio Campregher
Sérgio Campregher
Sérgio Campregher é historiador pela Uniasselvi/Fameblu e fala sobre política nacional e internacional e curiosidades. Escreve de Blumenau.
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