“O poder não corrompe o homem; revela-o”. Você já ouviu esse ditado popular. Serve como resposta quando algum ingênuo afirma que fulano era honesto, mas a política o transformou em ladrão. Já pensou nisso? Fui ao painel “Trânsito: todos juntos pela atenção à vida”, em Blumenau, no último dia 23, e assimilei.
O patrulheiro da Polícia Rodoviária Estadual de Santa Catarina, Rafael Melati, falou sobre os três poderes de que o ser humano se reveste quando entra no automóvel: invisibilidade, força e rapidez.
Invisível fica pois dentro da cápsula de lata, ninguém pode identificá-lo com precisão; nem suas roupas, seu tamanho, tampouco seu rosto ou compleição física. Forte porque no embate ser humano x automóvel, não precisa ser nenhum cientista genial para descobrir quem leva a pior. E rápido porque só tem um homem que fez 100 metros em menos de 10 segundos: o velocista jamaicano Usain Bolt. Em 2009, Bolt bateu o recorde mundial nos 100 metros rasos cravando 9,58 segundos.
Se comparado aos carros modernos, Bolt fica muito atrás. Os modelos Kepler Motors Motion Hybrid Sportscar, exibido no Salão de Dubai de 2009, e o Weber Sportcar, exposto no Salão de Mônaco de 2007, fazem os mesmos 100 metros e 2,5 segundos.
Agora imagine o motorista brasileiro com suas frustrações, decepções com a vida pública, onde um quer devorar o outro, o ambiente hostil como é o trânsito e tendo esses três poderes nas mãos. Junte tudo isso a falta de educação, solidariedade e uma cultura fraterna que priorize o ser humano.
O semáforo está no amarelo, mas o poder da rapidez permite ao infrator escapar da espera. Se tiver que enfrentar um ciclista, pedestre ou motociclista a força estará ao seu favor; e escondido no casulo metálico, fica difícil reconhecê-lo. Há a possibilidade de averiguação pela placa, mas basta o criminoso abandonar e o veículo e alegar que não era ele quem estava dirigindo que não há flagrante.
Fica fácil entender porque o Brasil é o 4º país das américas em números de mortes no trânsito. O dado é da OMS (Organização Mundial de Saúde), com base em 2016. Lamentavelmente, o estudo também prevê que até 2030, o Brasil pode ter um milhão de mortes por ano. Um milhão!
O patrulheiro Melati deu exemplos de como atitudes positivas no trânsito facilitam a convivência e as relações humanas. Me chamou a atenção o caso da Suécia.
Os motoristas que chegam mais cedo em seus trabalhos, deixam os carros mais longe e vão caminhando. Assim, aqueles que chegam encima da hora, podem estacionar mais perto da entrada e não se prejudicam. Por outro lado, esses que deixam seus carros mais longe, têm tráfego livre quando saem, pois não há muitos motoristas e, por consequência, congestionamentos pela frente. Este é apenas um item de uma cultura de trânsito que prioriza a solidariedade em detrimento dos três poderes.
É claro que quem não tem firmeza de caráter sólida e uma concepção de vida voltada para fazer o bem, vai usar os três poderes para o mal. Estes, quando não são os causadores, são as vítimas da dor, choro, velório, caixão e cemitério.
Por isso é cada vez mais necessária a sinalização, leis rígidas, punição severa e fiscalização constante por parte de todas as polícias. O ser humano só teme aquilo que respeita. Enquanto não houver uma cultura solidária de trânsito, só o poder autorizado e veemente das forças públicas pode enfrentar e coibir esses criminosos de trânsito em suas máquinas provedoras dos três poderes. Estes, provando a todo tempo, que o poder não os corrompeu, apenas os revelou.
Nilton Borges é cidadão, consumidor, pagador de impostos, e eleitor.