sexta-feira, 19 de abril de 2024
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Luciano Do Valle – Um gol a menos no esporte

Luciano morreu no sábado (19), vítima de um enfarto em Uberlândia, MG. (gminas.tv)
Luciano morreu no sábado (19), vítima de um enfarto em Uberlândia, MG. (gminas.tv)

Era um sábado de aleluia, tranqüilo e sereno, que antecedia o domingo de páscoa esperado pelos brasileiros. No entanto, uma notícia vinda do Triângulo Mineiro tomaria toda uma comunidade esportiva de assalto e sem tempo para respirar. Em Uberlândia, cidade imortalizada nas canções sertanejas, silenciava-se a voz de Luciano Do Valle, que muito além do narrador, era um verdadeiro “sportsman” do país, fomentando e dando luz a modalidades esportivas até um tempo ignoradas pela população maciçamente encantada pelo futebol.

Nascido em Campinas, interior de São Paulo, Luciano viu seu talento não caber dentro da Radio Educadora da cidade. Foi o narrador principal da Rede Globo durante muito tempo, imortalizando seu estilo de narração em várias copas em que estaria cobrindo. A F1 em seus tempos áureos de Fittipaldi, Pace e Piquet também estava entre seus trabalhos mais destacados.

Na Globo, de 1970 a 1982, os primeiros passos (UOL)
Na Globo, de 1970 a 1982, os primeiros passos (UOL)

Depois de um breve tempo na Record, Luciano partiu para sua mais destacada missão: Tornar a ainda pequena Bandeirantes na “nova força do esporte”, como ficaria conhecida nos anos 80. Além do futebol e de suas locuções históricas, Do Valle trouxe a luz dos brasileiros diversas modalidades, antes desconhecidas, e que agora enchiam ginásios, ringues e até salões de jogos de hotéis e clubes.

O vôlei está entre uma de suas obras mais importantes. Na luta para tornar o esporte uma referencia no país, Luciano conseguiu a proeza (diga-se de passagem) de lotar o Maracanã, palco máximo do futebol nacional, para o pontapé oficial do nosso voleibol. Foi em 1983, quando 93 mil pessoas presenciaram a marcante vitória do Brasil sobre a URSS. O maior público de uma modalidade de esporte dito amador do mundo. Daquele dia em diante, nomes como Bernard, Xandó, William, Motanaro e Renan se tornariam ídolos nacionais das quadras.

E não parou no vôlei. O garimpo de Luciano percorreu o boxe (revelando Maguila para o mundo), na sinuca (trazendo o duelo de Rui Chapéu e do inglês Stevie Davis, os melhores do mundo, para o hall do Hotel Transamérica, em SP), no basquete (imortalizando a “rainha” Hortência e “Magic” Paula, e trazendo a NBA para os brasileiros), nos campeonatos de futebol pelo mundo (Italiano, espanhol), e revelando o incrível mundo da Fórmula Indy aos amantes da velocidade, com as corridas marcantes de Emerson Fittipaldi e demais brasileiros nas pistas da terra do Tio Sam.

A proeza de Luciano que valeu prata e ouro: Tornar o vôlei a segunda modalidade brasileira. Mais de 90 mil assistiram a vitória do Brasil sobre a URSS, por 3 sets a 1, em 1983. (Procrie)
A proeza de Luciano que valeu prata e ouro: Tornar o vôlei a segunda modalidade brasileira. Mais de 90 mil assistiram a vitória do Brasil sobre a URSS, por 3 sets a 1, em 1983. (Procrie)

Não era simplesmente um profissional do esporte, era em si a personificação máxima do conceito de esportista que tantas vezes o brasileiro faz-se esquecer. Mesmo num país acostumado a torcer para “quem ganha”, Luciano era torcedor de todos os lados, eternizando momentos com uma narração única, vibrante, firme e forte, tal qual o torcedor extasiado com o lance que acabava de protagonizar. Foi assim na vitória história de Emerson Fittipaldi em Indianápolis, 1989, na conquista do ouro do vôlei brasileiro em Barcelona, 1992, na conquista do mundial de basquete feminino em Cuba, 1994, e tantas outras.

autoracing
Indianápolis, 1989. A batida de Al Unser Jr (no muro) encerrava o duelo com Emerson Fittipaldi (carro branco e vermelho). O brasileiro era o primeiro a vencer no templo do automobilismo, com a voz de Luciano eternizando o momento. (autoracing)

Era algo que vinha de dentro, do torcedor disfarçado de narrador esportivo que não economizava em adjetivos e empolgação. E tantos gols foram, um deles merece até destaque de minha parte. Foi no “mundão” do Arruda, em Pernambuco, no amistoso Brasil X Iugoslávia. Em um dos 3 gols de Zico na vitória de 4 a 2 da seleção diante dos pernambucanos extasiados pela magia que o galinho trouxe em um lance apenas, onde invadiu instintivamente a zaga iugoslava e marcou um tento “de placa”, como Luciano repetiria várias vezes num grito quase gutural de “Gol”.

Em outro momento inesquecível do nobre esporte bretão, imortalizaria um lance do futuro colega de cabine nas transmissões dos dias atuais. O gol de Neto para o Guarani era, como ele dissera, “um gol para todo mundo ir embora”. Outro momento que não tem substituto para a voz de Luciano.

Em um ano de Copa, o Brasil vai para campo com um grito de gol a menos nos tentos do mundial. O esporte brasileiro fica sem um gol nas mais diversas modalidades esportivas que nasceram através de sua voz. Foram 50 anos de voz ativa, 66 de vida, que infelizmente se encerram cedo para vários esportistas brasileiros que perderam uma referencia de vibração e força.

Assim se vai Luciano Do Valle, hoje e sempre, “o melhor gol da TV”.

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