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Getulio Vargas: o idolo que não caiu

24 de agosto de 1954

A morte possui uma grande ação purificadora. Os defeitos dos homens públicos são uma espécie de túnica que eles despiram, ao deixarem o mundo, substituindo-a pela mortalha funerária, que é veste limpa de todo o pecado ou impureza.

Carreguemos as tintas da época no intento de rememorar a edificação do mito.

VARGAS Foi um exímio jogador de xadrez. Usou como tabuleiro o cenário político nacional e como pedras os homens mais sagazes de seu tempo. “Pula o obstáculo somente quando ele te depara” era seu Slogan ao longo de um quarto de século de poder, agitando as rédeas do indócil corcel que é o Brasil que corre demais quando o terreno lhe escapa sobre as patas. Gétúlio soube segurar as rédeas com mais habilidade de que com firmeza. Para podermos agir de conformidade com esse lema, devemos confiar, tanto em nosso cavalo, quanto em nossa arte de cavalgar e estar preparados, em caso de o obstáculo ser demasiado alto, não para pulá-lo, mas para contorná-lo. E ai está um dos segredos de Vargas. Uma perfeita elasticidade de pensamento é condição preliminar para quem escolhe este ou aquele outro princípio análogo, como base de ação, o que, aliás, o extinto presidente sempre fez. Deve-se poder calcular não somente as possibilidades do cavalo e da própria arte de cavalgar, mas também o obstáculo: o adversário. Getúlio sempre estudou a forma e o momento oportuno de contornar seus adversários até desarmá-los completamente. Era de opinião de que a participação em lutas políticas deve ter, como finalidade, não só derrotar o adversário, mas também persuadi-lo. Era um dos rasgos característicos de sua personalidade, que sempre norteou sua vida por esse prisma.

ESTILO VARGUISTA mantém grande influência na política brasileira. Reflexo do latente populismo.
ESTILO VARGUISTA mantém grande influência na política brasileira. Reflexo do latente populismo.

FIGURA SIMPLÓRIA E PATERNAL

Entre o povo, o presidente extinto sempre desfrutou de uma posição invejável. Sua afabilidade, seu sorriso constante, muitas vezes indefinido, o levaram a conquistar quem dele se aproximasse. Por isso mesmo seus mais constantes adversários temiam ter contato dele. Era um polvo de simpatia e de aglutinamento. Sua figura simplória e paternal era encarada pelo povo como uma espécie de continuação de sua família. Getúlio acrescia a sua esfuziante personalidade um detalhe singular: seu charuto havana, companheiro inseparável das horas de derrota e de vitória. Quem queria agradar o presidente era só ofertar-lhe uma caixa de charutos. Dessa forma políticos e diplomatas estrangeiros davam de presente ao presidente charutos que ele fumava a todo instante. Por isso quando se falava em um Havana o nome de Vargas era logo lembrado como complemento. Depois de sua morte, esse detalhe jamais foi esquecido pelo povo.

TRAÍDO PELA TRANSIGÊNCIA

O brasileiro viciou-se em amar Getúlio e a querer conservar sua idolatria no tempo e no espaço. Para ele, Getúlio conserva-se por cima das críticas de seus opositores e quem sabe, talvez da própria história. A geração entre as décadas de 1930 e 1950 criou-se com o nome de Getúlio repetido a todo instante em casa e no rádio e sua figura lhe era familiar mesmo antes de engatinhar. Bastava sair a rua para ver o famoso retrato do simpático gaúcho distribuído pelo Departamento de Imprensa e Propaganda por todos os recantos do país. Após seu desaparecimento o povo não acostumou-se a idéia que o “ velhinho” não se encontra mais na terra. E politicamente, mesmo depois de falecido, o presidente de um quarto de século, continuou a “fazer” gente. O povo seguiu amando o desaparecido presidente. Apenas não compreende como Getúlio, que foi criado na vida simples e tranqüila das estâncias e que por isso mesmo assentou desde cedo a calma imperturbável que sempre o caracterizou, que não o abandonou nas situações mais difíceis, viesse a transformar-se completamente no trágico 24 de agosto de 1954. O homem do campo que fora obrigado a aguardar as determinações da natureza. Getúlio, o homem suicidou-se. Mas o ídolo não caiu.

* Edificação do mito: Uma nota na imprensa – O Mundo Ilustrado, Rio de Janeiro, 24 de agosto de 1955. número 10.
PANORAMA POLÍTICO DA ÉPOCA

Após o suicídio de Vargas a situação política no Brasil permaneceu a mesma coisa. Um dos poucos avanços no novo governo foi a modificação do panorama administrativo, que operou a descentralização, ou melhor descongestionou o Executivo de muitas atribuições que o falecido presidente não abria mão. Na ambiência da vida partidária uma crise política toma forma com a União Democrática Nacional( UDN) direcionando para o parlamentarismo. O ministro da Guerra, interpreta, a pouco mais de um mês das eleições, o papel de Pilatos, lavando as mãos. Ou vocês fazem o que a UDN deseja ou eu não me responsabilizarei pela ordem pública. Isto é, nada mais, nada menos o que disse em entrevista a imprensa nacional e estrangeira, o louro oficial de ascendência britânica, General Teixeira Lott.

Neste contexto político. O que todos desejavam eram eleições livres, limpas, das quais deveriam ser fiadores o Executivo e o Judiciário. A fórmula para sair deste impasse é proposta pelo deputado José Maria Alkmin e sugerida pela imprensa: Oportunidades iguais a todos os candidatos, evitando que o eleitor compareça a seção eleitoral com o voto material que lhe entregou o cabo eleitoral. A imprensa pró-getulista faz campanha afirmando ser mais simples e mais consciente esta fórmula.

Danton Coelho, ex-presidente do PTB e ex-ministro do trabalho de Vargas deixa o partido a fim de aceitar o convite de Ademar de Barros para completar sua chapa como candidato a vice-presidente em 1955. Coelho foi o grande articular da candidatura de Vargas em 1950 e sua influência foi decisiva para contar com o apoio de Ademar de Barros na vitória de Vargas no pleito de 50. O rearranjo político de Danton Coelho segue a cartilha varguista: a persuasão. Adhemar de Barros e Danton Coelho concorrem à presidência da república pelo Partido Social Progressita (PSP), sendo derrotados pela chapa Juscelino Kubitschek. e João Goulart. O presidente da república Café Filho, que também era do PSP, não apoiou Ademar.

Sérgio Campregher
Sérgio Campregher
Sérgio Campregher é historiador pela Uniasselvi/Fameblu e fala sobre política nacional e internacional e curiosidades. Escreve de Blumenau.
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